[Narrada/ aberta] Em busca da gloria!

As ruas de Luminari eram calmas, as pessoas passavam quase que se deslizassem, muito educadas, cumprimentando quem batiam a visão, mas de forma quieta e graciosa. Drogoth passava como um estranho, mas que mesmo assim não deixava de receber saudações, além de ter seu caminho livre, pois parecia ser evitado, mesmo que não trouxesse um sentimento de preconceito, apenas de respeito ao seu espaço.

A iluminação arroxeada das ruas era como um véu que recobria a tudo com seu calor morno, não sendo o suficiente para trazer suor à testa do jovem, mas com certeza o aquecia para usar roupas mais pesadas.

Arrax não tinha esses mesmos sentimentos, pois participava apenas do frio montanhesco. Ventos fortes, neve grossa que caía como adagas dos céus, mas que mesmo assim não incomodavam o ser draconídeo, que poderia até se sentir bem com isso. As concentrações nebulosas faziam desenhos nos céus quando não era um simples tapete cinzento, as vezes fazia acúmulos grandes que parecia uma nova montanha que flutuava por perto, movimentando-se preguiçosa na medida que o vendaval a empurrava, mas apenas fazia sua massa girar ou desfazer-se como algodão na água.

Desconhecia os locais, então sem uma preferência, abordou uma pessoa alta de vestes negras, parecia muito uma clériga, mas ao se virar e voltar sua atenção ao rapaz, era difícil dizer se não era um dos enfermos que viviam na cidade em busca de cura.

Era maior que o rapaz, cobria o rosto com uma máscara e respirava pesado por trás dela. O cheiro ferroso misturado a café era incômodo para suas narinas. Impossível dizer se o observava ou não, pois havia uma película de vidro (que poderia servir como óculos) diante dos olhos. Tudo indicava ser alguém com alguma deformação causada por doença ou maldição, e por isso recobria o corpo todo, mas típico dos Clericus, uma mão mumificada erguia-se debaixo dos panos (deixando dúbio se era o braço daquela pessoa ou apenas um macabro suporte) e carregava a lanterna, pequena e com uma iluminação azulada, também bem comum das Lágrimas da Lua.

- ...Na árvore. - Sua voz abafada saía como um suspiro estrangulado, parecia que já estava falando e emendou para responder ao rapaz, mas não havia viva alma por perto para poder dizer que alguém estava trocando alguma ideia com essa pessoa. Como antes, as pessoas evitavam Drogoth, circundando como se ele fosse uma rocha em meio a uma correnteza, e agora, com uma súbita atenção e o silêncio da resposta ríspida sem tato, curiosidade ou qualquer normal social, era como se ambos estivessem em seu próprio mundo e a multidão ao redor não parecia ver o fantasma que o cavaleiro via, ou muito menos ele em si.

Com a mão livre, essa pessoa apontou em direção da Luz da Maisha e dando credibilidade para a informação que a guilda houvera dado para seu membro. Essa mão era mais saudável, mas totalmente enfaixada e não possível ver a pele, mas que com certeza havia excesso nos cuidados, pois as amarras faziam voltas ao redor do punho e dos dedos, porém muito mais que o necessário, deixando mais grosso do que deveria ser.

Não havia motivos para se deter ali, então Drogoth fora aonde já iria inicialmente e o cenário mudava levemente, pois se antes era uma cidade simples, com caminhos em pedra, agora ele estava  em uma pequena subida por conta das raízes que saíam mescladas da terra, não de forma bruta e sim, suavemente, meio recobertas, mas ainda, expostas. O tronco majestoso da árvore que os recobria tinha sua madeira lascada para produção do óleo de lamparina, o que deixava seu interior esbranquiçado à mostra, uma parte nua do vegetal que era "estancada" com um papel de seda, fino e transparente que envolvia para não causar grandes danos à estrutura. Alguns clérigos estavam ali, sentados conversando, com grupos de doentes ou rezando, sem a presença de outros turistas. A chegada do rapaz fora recebida por olhares curiosos, mas não havia muito o que se dizer ou fazer.

Acima, sentado sobre um tronco em posição de lótus e comendo um bolinho, estava Harpion. Seu olhar vagava o nada, apenas saboreando seu lanche enquanto observava o movimento pelas ruas e indo até onde sua visão permitia, ou melhor, a tempestade fora dela. Não parecia feliz ou triste, apenas pensativo, com o semblante sério.

Arrax ouvia os assobios do vento e notava que havia algo de diferente. Uma avalanche, talvez. Era difícil dizer o que ocorria com a baixa visibilidade, ainda mais por sobrevoar tão acima do que já era conhecido como "Corta-Céus".

De trás de Drogoth, a figura que ele houvera pedido informações arrastava seus pés e parava, sem dizer coisa alguma, apenas sendo uma pessoa extremamente estranha e próxima. Por conta de sua altura superior, abaixou a cabeça de uma forma nada natural (parecendo que eram duas ou três pessoas abaixo dos panos, pois nenhuma coluna faria uma curva tão acentuada).

- ...Na árvore. - Repetia enquanto erguia a mão saudável em direção do homem que estava sentado e comendo. Ainda acima, por conta da movimentação impossível do membro ressecado, a lanterna balançava entre os dedos duros e fazia um som de sino e gotejamento. Drogoth ouviu o pequeno tilintar como se fosse dentro de sua cabeça, não de forma que machucasse seus ouvidos, mas que abafava totalmente seus pensamentos. Mais uma vez, se antes haviam olhares curiosos para ele, agora ninguém mais "o via", seja por estranheza da companhia ou por evitar o olhar, ninguém mais sequer voltava a atenção naquela direção.

Spoiler: