VII. Penas Douradas.

O centro da praça, onde antes havia uma fonte que jorrava água cristalina, agora se erguia a figura monstruosa da raposa negra. Sua pele estava coberta de símbolos rúnicos, e seu corpo pulsava com uma energia sombria que parecia distorcer a própria realidade ao seu redor. Ele não era mais apenas uma raposa; era uma abominação, uma criatura que havia sacrificado sua própria essência em troca de um poder inominável.


— Você veio, afinal... — sua voz ecoou por entre as ruínas, carregada de malícia. — Bem a tempo de testemunhar meu renascimento.


O chão ao redor da raposa estava marcado com um círculo de fogo negro, chamas que dançavam em padrões hipnóticos, como serpentes prontas para atacar. Eu sabia que precisava interromper o ritual antes que ele estivesse completo, ou o mal que ele representava se tornaria imensurável. Mas, ao mesmo tempo, eu sentia o peso da responsabilidade sobre minhas asas. Esta batalha não era apenas por mim, mas por todos que sofreram nas mãos dessa criatura.


— Não permitirei que você conclua isso — declarei, avançando com a Quackblade erguida. — Hoje, você encontrará seu fim.


A raposa riu, um som que reverberava nas paredes destruídas das casas ao redor, um eco de pura maldade. — Você realmente acha que pode me deter, pato? Eu sou a escuridão encarnada. Eu me alimentei do medo e do ódio que você carrega, e agora, sou invencível!


Ele ergueu uma das garras e, com um gesto, as chamas ao redor do círculo se intensificaram, criando uma barreira que me impedia de me aproximar. Mas eu sabia que a Quackblade tinha o poder de romper qualquer feitiço sombrio, desde que eu fosse capaz de canalizar toda a minha determinação através dela.

VII. Penas Douradas.

Fechei os olhos por um breve momento, sentindo o peso da espada em minha asa, e respirei fundo. A lembrança de Kael, de suas palavras sobre a verdadeira natureza da Quackblade, me deu a força que eu precisava. “A espada era mais do que uma arma; era um símbolo, uma extensão da minha própria alma”. Com esse pensamento, avancei, a lâmina brilhando intensamente enquanto eu cortava através da barreira de fogo negro.


O impacto foi como um trovão. A Quackblade colidiu com as chamas, e por um instante, tudo ao meu redor pareceu parar. As sombras se debateram, resistindo à luz, mas eu não recuei. Com um grasnar de guerra, forcei a espada adiante, sentindo o poder divino fluindo através de mim. A barreira se partiu, e as chamas negras se dissiparam como fumaça ao vento.


— Não! — gritou a raposa, sua voz agora tingida de medo. — Isso é impossível!


Com a barreira destruída, avancei sobre ele. A raposa atacou com todas as suas forças, suas garras rasgando o ar em movimentos rápidos e letais. Mas eu estava preparado. Cada movimento, cada golpe, era desviado com precisão, a Quackblade cortando através das trevas que ele lançava contra mim. A batalha era feroz, e a cada segundo que passava, o vilarejo parecia vibrar com a energia liberada por nosso confronto.


Ele era rápido, muito mais rápido do que eu poderia prever. Cada movimento era um borrão, cada ataque letal e tão preciso, como se estivesse antecipando meus próprios movimentos. Mas eu também era rápido, esquivando-me com destreza, minhas penas cortando o ar enquanto me reposicionava, tentando encontrar uma abertura.


— Você pensa que pode me derrotar? Um pato? Um simples e miserável pato? — A raposa negra rugiu, saltando para frente em um ataque selvagem.


Com um bater de asas, evitei o golpe, deslizando pelo chão encharcado de sangue, a Quackblade riscando um arco brilhante no ar enquanto tentava alcançar seu pescoço. A lâmina passou a poucos centímetros de sua pele, cortando apenas o vazio enquanto a raposa se afastava com uma risada cruel.


— Eu não sou apenas um pato! — retruquei, o cansaço começando a pesar sobre mim, mas não permitindo que isso enfraquecesse minha determinação. — Eu sou a vingança!

VII. Penas Douradas.

A raposa riu, um som que reverberava pelo vilarejo em chamas, mas eu não me deixaria abalar. A lembrança do que ela havia feito, de todas as vidas que destruiu, alimentava minha fúria, fortalecendo meu braço – ou melhor, minha asa – para continuar.


A luta prosseguia, um jogo mortal de garras contra lâmina. Cada golpe era trocado com ferocidade, o chão sob nossos pés desmoronando em pedaços enquanto a batalha se intensificava. Eu sabia que não podia manter esse ritmo por muito tempo; meu corpo, mesmo treinado, era limitado pelo que eu era.


— Você está cansando, pequeno pato — A raposa sibilou, seus olhos brilhando com um prazer maligno. — Não pode durar por muito mais tempo.


Ignorei a provocação, concentrando-me no próximo movimento. Meus olhos, pequenos mas atentos, procuravam qualquer fraqueza, qualquer hesitação. E então eu vi – um leve tremor em sua pata direita, uma pequena hesitação que revelava o dano que eu havia causado. Era agora ou nunca.


Com um bater rápido das asas, voei baixo em direção a ela, a Quackblade brilhando com a força da minha determinação. Concentrei todo o meu poder em um único golpe, mirando o ponto exato que eu havia notado. Mas, no último segundo, algo – uma sombra, uma presença sombria – surgiu ao lado da raposa.

VII. Penas Douradas.

A Quackblade parou no ar, a centímetros de sua pele, segurada por uma força invisível. A raposa sorriu, um sorriso que transbordava vitória, enquanto eu lutava para entender o que estava acontecendo. Um arrepio percorreu minhas penas enquanto percebia que havia subestimado o poder das trevas que a cercava.



— Você não esperava por isso, não é? — ela zombou, suas garras se erguendo para o golpe final. — Sua vingança termina aqui, Ovonulo.


Minha mente correu em busca de uma solução, mas o tempo parecia congelado. O mundo ao meu redor estava em silêncio, exceto pelo som das chamas que queimavam o vilarejo. Sabia que precisava agir, mas algo, alguma coisa, me impedia de mover a lâmina. Era como se a própria noite tivesse se voltado contra mim, paralisando minha asa no meio do ar.


— Não... Não é assim que termina.


Sussurrei, forçando cada fibra do meu ser a empurrar a Quackblade, a romper a barreira invisível que me segurava. Mas o poder da escuridão era avassalador, e minha força, embora grande, parecia insuficiente naquele momento.


A raposa avançou, pronta para o golpe final. Eu podia ver a vitória em seus olhos, sentir a frieza de sua aproximação. Mas, no fundo de mim, sabia que isso não era o fim. Não poderia ser o fim. Algo mais estava em jogo, algo que eu ainda não compreendia completamente.


E então, no último instante, quando as garras da raposa estavam prestes a rasgar meu peito, o mundo ao meu redor explodiu em luz. Uma onda de energia irradiou de mim, um poder que eu nem sabia que possuía, e quebrou a paralisia que me segurava. A raposa foi lançada para trás, chocando-se contra os escombros de uma casa destruída, enquanto eu ofegava, surpreso com a força que acabara de liberar.

VII. Penas Douradas.

A Quackblade brilhava com uma intensidade nunca vista antes, suas runas pulsando como se estivessem vivas. Era como se a espada tivesse se conectado a algo dentro de mim, uma força que até então estava adormecida. Sentia o calor da lâmina nas minhas asas, mas ao invés de queimar, me dava força, uma energia renovada que curava as feridas do meu corpo e restaurava minha determinação.


A raposa se levantou, cambaleando, sua figura grotesca agora ainda mais distorcida. Seus olhos, antes cheios de arrogância, agora estavam marcados pelo medo e pela confusão. Ela sabia que algo havia mudado, que o poder que eu agora empunhava estava além do que ela esperava.


— Como... Como você fez isso? — ela rosnou, o medo evidente em sua voz.


— Não sou eu que faço — respondi, minha voz firme. — É a vontade daqueles que você destruiu. É o poder de todas as almas que você condenou, e elas clamam por Vingança!


Com essas palavras, avancei novamente, a Quackblade rasgando o ar com uma velocidade sobrenatural. A raposa tentou se defender, mas suas forças estavam diminuindo. A cada golpe, eu sentia as sombras ao redor dela se dissiparem, fragmentos de sua magia negra se quebrando sob o poder da espada.


Ela tentou se afastar, mas eu não a deixei escapar. Com um golpe certeiro, atingi sua pata dianteira a decepando, e ela gritou de dor, caindo de joelhos. Sua forma monstruosa começou a se desfazer, a magia que a sustentava enfraquecendo. A Quackblade brilhava ainda mais, como se estivesse absorvendo as trevas que outrora a envolviam.

— Não... Isso não pode acabar assim... — ela sibilou, sua voz agora fraca e trêmula. — Eu sou a escuridão... Eu não posso ser destruída…


Com um último grito de desafio, a raposa negra tentou se levantar, mas era tarde demais. A Quackblade desceu em um arco luminoso, cortando através de sua carne e ossos seu corpo ao meio. A criatura soltou um urro de agonia enquanto sua forma começava a se dissolver, as sombras que a compunham se dissipando no ar como fumaça.

VII. Penas Douradas.

A luz da Quackblade envolveu a raposa, e por um momento, tudo ficou em silêncio. Então, com um último lampejo de luz, a criatura desapareceu, deixando apenas o vazio onde ela estivera. As sombras no vilarejo começaram a se dissipar, e as chamas que ainda queimavam lentamente se extinguiram, como se o próprio mundo estivesse limpando os vestígios da presença maligna que um dia governará ali.


Eu caí sobre minhas patas, a Quackblade ainda brilhando fracamente em minhas asas. O cansaço finalmente me alcançou, e por um momento, senti a escuridão me puxar para a inconsciência. Mas havia uma paz na minha mente, uma sensação de que finalmente havia cumprido o que precisava ser feito.


— Acabou… — sussurrei, antes de permitir que a exaustão me dominasse. A Quackblade, sua missão cumprida, finalmente apagou seu brilho, e tudo ao meu redor escureceu enquanto eu caía em um sono profundo.



O silêncio do amanhecer foi quebrado pelo som suave do vento entre as folhas e o canto distante de pássaros. Quando finalmente abri os olhos, o céu estava tingido de rosa e laranja, anunciando um novo dia. Estava deitado no centro da praça do Vilarejo de Plumas, onde a batalha final havia ocorrido. Meu corpo estava dolorido, mas vivo.


A Quackblade estava ao meu lado, repousando na terra agora tranquila. Seu brilho suave havia retornado, mas agora, parecia mais sereno, como se estivesse em repouso.


Levantei-me com dificuldade, olhando ao redor. O vilarejo ainda estava em ruínas, mas a opressão que antes dominava o lugar havia desaparecido. Agora, restava apenas a paz melancólica de um local que havia suportado tanto sofrimento. A destruição ainda era evidente, mas o mal que uma vez infestou aquelas terras havia sido erradicado e eu sabia que aqueles que morreram poderiam finalmente descansar em paz.


Com a Quackblade firmemente em minhas asas, comecei a caminhar em direção ao horizonte, sabendo que minha jornada ainda não havia terminado. Embora a vingança tenha sido alcançada, o preço que paguei foi alto, e as cicatrizes, tanto físicas quanto emocionais, ficariam comigo para sempre.


Mas eu havia sobrevivido. E mais importante, eu havia triunfado sobre a escuridão que ameaçava engolir não apenas a mim, mas todos aqueles que amei. Com um último olhar para o Vilarejo de Plumas, prometi a mim mesmo que nunca mais permitiria que as trevas voltassem a dominar.

VIII. Penas Negras.

O som de passos apressados ressoou atrás de mim, e uma sombra familiar se destacou contra a luz fraca das lâmpadas da rua. Kael, o velho corvo, estava ali, mas não era o sábio mentor de antes. Suas penas estavam desordenadas e seu olhar exibia uma exaustão que falava de uma luta árdua e recente. Kael sempre fora uma figura de autoridade e respeito, mas agora parecia carregado com o peso de um grande fardo.


— Nii… — Sua voz estava fraca, mas ainda carregava um tom de autoridade que não podia ser ignorado. — Preciso falar com você. É urgente.


A surpresa e a preocupação me dominaram instantaneamente. Kael, sempre uma figura de força e sabedoria, estava claramente em dificuldade. Aproximei-me com pressa, a inquietação crescendo em meu peito.


— O que aconteceu, Kael? — Perguntei, a preocupação evidente em minha voz. — Por que você está tão ferido?


Kael fez um esforço visível para se manter de pé, suas garras tremendo. Ele estava claramente cansado, e seus olhos revelavam um medo profundo. — Não temos muito tempo. Algo que eu deveria ter dito há muito tempo está se revelando agora. O verdadeiro inimigo que você ainda não conheceu está entre nós.

VIII. Penas Negras.

Antes que eu pudesse responder, Kael olhou por cima do meu ombro, seus olhos cheios de uma preocupação intensa. Senti uma presença sombria se aproximando, uma sensação de que algo sinistro estava prestes a acontecer. O ar parecia se tornar mais denso, e uma corrente de frio percorreu minha espinha.


— Há alguém que estava por trás das raposas negras, alguém que se escondeu na escuridão e agora está pronto para agir — Kael continuou, sua voz um sussurro tenso. — Ele se chama Nyxar, e sua ambição é ainda maior do que qualquer coisa que enfrentamos até agora.


O nome "Nyxar" ressoou em minha mente, lembrando-me de histórias antigas sobre um pato que havia desaparecido misteriosamente, uma figura envolta em sombras e mistério. Nyxar havia sido um aliado das raposas negras, um pato maligno que ajudou a orquestrar suas ações. Com a queda das raposas, ele não iria permanecer escondido; em vez disso, buscava consolidar seu poder, esperando o momento certo para agir.


— Quem é Nyxar? — Perguntei, a sensação de urgência crescendo.


Kael hesitou, lutando para encontrar as palavras certas. Seu olhar era grave, e ele parecia estar lutando contra uma força interna para manter o foco.


— Nyxar é um mestre da manipulação e da magia negra. Ele foi um dos principais aliados das raposas negras, ajudando a alimentá-las com poder e influência. Com você caçando uma a uma as raposas negras, ele não se escondeu; em vez disso, aproveitou o caos para avançar ainda mais em seus próprios objetivos sombrios.

VIII. Penas Negras.

As sombras ao nosso redor pareciam se esticar e se agitar, como se estivessem respondendo à gravidade da situação. O silêncio do Vilarejo de Plumas parecia mais profundo, como se todos os sons estivessem sendo absorvidos pela tensão crescente. O brilho das lâmpadas parecia pálido e distante, e uma sensação de pressentimento tomou conta de mim.


— Você precisa encontrar Nyxar antes que ele faça o que planejou. O que está em jogo agora é maior do que qualquer coisa que você já enfrentou. — A voz de Kael estava carregada de um peso de urgência, e eu podia ver que ele estava lutando para se manter consciente.


Antes que eu pudesse responder, grasnares distantes cortaram o silêncio, e Kael virou a cabeça, seu olhar cheio de terror. O som era agudo e desesperado, e a sensação de que algo terrível estava prestes a acontecer se intensificou. Sem hesitar, comecei a me mover, guiado pela urgência e pelo medo crescente. As ruas estavam mergulhadas em um manto de sombras, e cada passo parecia me levar mais perto de uma revelação sinistra. Meu coração batia acelerado enquanto eu avançava, a Quackblade pronta ao meu lado.


Segui o som, cada passo ecoando em minha mente. O medo e a adrenalina misturavam-se, criando um turbilhão de emoções. Meu olhar estava atento a qualquer sinal de perigo, e cada sombra parecia ter uma presença própria.


Uma figura imponente estava de costas para mim. Era Nyxar, envolto em um manto escuro que parecia absorver a luz ao redor. Sua presença era quase palpável, um peso de malevolência que tornava o ar denso e ameaçador. O manto de Nyxar se movia com um fluido sinistro, como se estivesse vivo com uma energia própria.

VIII. Penas Negras.

Nyxar virou lentamente, revelando um rosto que parecia fundido com as sombras. Seus olhos eram como poços de escuridão, penetrantes e frios. Ele me olhou com um sorriso que parecia carregar todo o desdém e o poder que ele possuía. Seus olhos brilhavam com uma luz interna sinistra, e sua presença parecia absorver toda a energia ao redor.


— Ah, finalmente. O pato que desafiou o destino. — Sua voz era um sussurro profundo e sinistro, carregado de um poder que parecia ameaçar romper a própria realidade. Cada palavra parecia ter um peso próprio, como se carregasse uma carga de magia negra que reverberava através do ambiente.


Eu estava congelado, a intensidade da cena fazendo meu coração bater mais rápido. Nyxar não parecia interessado em uma batalha agora; ele estava simplesmente observando, como se esperasse o momento certo para revelar seu verdadeiro plano. A atmosfera estava carregada de uma tensão quase elétrica, e eu senti que estava à beira de uma revelação sinistra.


Com um bater de asas sutil, Nyxar fez uma onda de energia negra se erguer ao seu redor, envolta em uma aura de magia sombria. O ar ficou gelado, e eu senti uma presença maligna crescendo, ameaçando engolir tudo ao nosso redor. A energia negra parecia formar formas indistintas, sombras que se moviam e se entrelaçavam como serpentes de escuridão.


Então, sem uma palavra adicional, Nyxar começou a se afastar, suas sombras se estendendo e envolvendo-o em um manto de escuridão. Ele desapareceu, deixando apenas a sensação de um mistério sinistro e uma sensação crescente de que algo ainda maior estava por vir. A praça estava agora mergulhada em silêncio novamente, e eu fiquei ali, atônito, enquanto o peso do que havia visto se instalava em minha mente.


O silêncio em Plumas parecia ter se intensificado, e eu sabia que a batalha que eu imaginava ser o fim era apenas o começo de algo muito mais sombrio e desafiador.


Nyxar havia deixado um sinal claro: a verdadeira luta estava apenas começando, e eu estava prestes a enfrentar os desafios que ainda estavam por vir. Com um último olhar para o vazio da praça, comecei a caminhar novamente, a Quackblade firmemente empunhada ao meu lado. O Vilarejo se estendia diante de mim, uma teia de sombras e segredos esperando para serem desvendados.


Os pensamentos sobre o que Nyxar poderia estar planejando começavam a se organizar em minha mente. A sensação de que algo sinistro estava por vir era esmagadora, e a urgência de encontrar respostas e enfrentar o novo inimigo se tornou uma chama constante em meu coração. O caminho à frente estava cheio de incertezas, mas eu estava decidido a enfrentar o que viesse, sabendo que a verdadeira batalha estava apenas começando.